Cadeira nº03

Patrona

Há, em relação à linguagem, uma progressão histórica do silêncio à verbalização, o que se observa não só na prática geral da linguagem como no discurso da ciência. Do século XIX para cá, veio se acelerando, de um lado, a produção de diversas linguagens e, de outro, a consequente contenção cada vez mais acentuada do silêncio, sobejamente no campo do discurso feminino: as palavras se desdobram ilimitadamente em mais palavras. Assim, quer se trate de dominação, quer se trate de resistência, é pela historicidade inscrita no tecido textual que é possível aprender a presença/ausência desta escritora e suas contemporâneas na identidade cultural brasileira.
Maria Cândida de Jesus Camargo escreve para registrar a sua vivência do cotidiano, capitalizando fatos, pensamentos, conservando e eternizando momentos, procurando conter o escoar do tempo. Sua obra é a história de uma aprendizagem. Aquela que conta, alternando evocações do passado com a reflexão, conseguindo imprimir ao texto imagens da memória e trajetória de vida.
Maria Cândida de Jesus Camargo, filha de Cândido Mendes Ribeiro Ferraz de Camargo e Maria Joaquina de Sousa Castro Camargo, nasceu em 6 de agosto de 1868, em Ponta Grossa, PR. Lá também fez seus estudos. Foi aluna atenta de Alzira Braga dos Santos e Antônio Martins de Araújo (poeta pontagrossense, dos bons, registrado em VOZES CAMPESTRES), professores dedicados com os quais fez seus primeiros estudos. Seja por dom inato, seja por influência de seus mestres e pelo contexto social e cultural em que viveu, Maria Cândida dedicou-se ao magistério público primário. Lecionou em Ponta Grossa e, ainda, em Imbituva, Prudentópolis, e, por último, Jaguariaíva. Nesta cidade fixou residência definitiva, aposentou-se em 1919, e viveu, ainda, mais trinta anos. Mais tarde, numa justa homenagem, a Academia Feminina de Letras do Paraná escolheu seu nome para uma das cadeiras da agremiação.
Maria Cândida Camargo, cedo, despertou para a poesia, quem sabe se por influência do mestre-poeta, ou simplesmente por seu amor à vida. E, logo, sob pseudônimos (Stela de Jesus, Stela Maria, Miriam e Aimar, e outros) já colaborava brilhante e abundantemente para jornais e revistas de cidades de todas as regiões de seu estado natal – Ponta Grossa: Campos Gerais, O Progresso, O Comércio; de Guarapuava: Guayra; de Castro: Dezenove de Novembro, Castro Jornal; de Paranaguá: O Itiberê, Marinha; de Antonina: Jornal de Antonina; de Sengés: Eco; de Tomazina: O Tomazina; e a capital, Curitiba: Diário da Tarde, A República, A Cidade, O Dia, Almanaque dos Municípios, Jornal dos Poetas, Correio dos Ferroviários. Publicou, também, com regularidade, seus trabalhos em periódicos dos dois mais importantes estados do país, São Paulo, Revista Feminina, Cidade do Matão, O Clarim e Rio de Janeiro, Copacabana, O Jornal, O Malho. Muito embora tenha produzido incessantemente, Maria Cândida Camargo nunca viu um livro seu editado. Alguns anos após sua morte, Rodrigo Júnior, eminente poeta, e a prof.ª Alaíde de Camargo Turech, sobrinha da da poeta reuniram em um volume seus principais escritos (49 poemas). A obra foi intitulada JÚBILOS E MÁGOAS e lançada em 1958.
Maria Cândida Camargo, a quem impressionava a amizade entre o pai e Carlos Gomes, conterrâneos e amigos de infância, nutria especial admiração pelo grande compositor e maestro. Sobre esse fato, compôs um soneto.
Apesar da variedade e da fecundidade de seus versos, é Maria Cândida Camargo poeta fiel a certos assuntos cotidianos e elementares: o amor, a amizade, a religião, a saudade, a família, a homenagem. A atitude diante de determinados temas traz uma perspectiva interessante e/ou útil para observar o desenvolvimento. Maria Cândida Camargo possuía facilidade e rapidez para compor poemas de melifluidas notas, é reconhecida como a “paisagista do verso”, são correntes, também, aqueles de tom eminentemente elegíaco, entretanto o que mais lhe evidencia o fazer poético, confirmando a decantada imagem de simplicidade, é que se permitiu transparecer em seus versos.
Profundamente católica, humilde, não de uma humildade tola e depressiva, a poeta nos deixou inúmeros versos carregados de fé, nos quais a religião configura bom solo para fincar raízes.Na construção de seus poemas, o amor à terra natal desdobra-se em estofes de luz, em perfeita sintonia com os costumes, valores e conceitos de época. O verbo da poeta pontua com precisão seu olhar embevecido por intermédio do caráter pictórico de seu texto.
Seu apego à natureza definitivamente manifestado em versos inspirados na sensibilidade de um lirismo que bem define o bucolismo das paisagens mortas realiza-se com o ritmo compassado e orgânico da natureza. Como bem diz Pompília Lopes dos Santos,”Em sua poesia encontramos o cheiro agreste das matas e o frescor das orvalhadas madrugadas” Introspectiva, Maria Cândida prefere os tons, sons e sensações da natureza. E na busca de desvendar em palavras os significados efêmeros dos ambientes naturais, a poeta tece os momentos que antecedem um novo dia em estrofes que, de tão subjetivas, paradoxalmente, as impressões tornam-se reais.
Fraternal e amorosa, envolve em poesia personagens de sua vida, quando historiciza em singelo orgulho a figura de sua mãe: “No rútilo santuário da memória/ Vejo de minha Mãe o doce vulto,/ Narrando-se, serena, a fiel história/ De sua vida, e ao recordá-la exulto//”, ou quando louva o primeiro mestre e incentivador: Antonio Martins de Araújo.
Maria Cândida Camargo dispensava aos poemas sua sensibilidade criadora e sua capacidade de abrir a alma de forma simples e natural. Plena de existência, a poeta imortalizou na sua poesia as aspirações, sensações e ideais da mulher de seu tempo. A tristeza, a solidão, a fé, o amor à terra natal e o sentimento de fraternidade se desprendem de seus versos. Mais que isso, estas opções temáticas, estrategicamente, permitiram que se aprofundasse na trama do cotidiano e recuperasse expressões e experiências femininas. A imortal poeta, cândida, mas forte, viveu sua vida nos versos que compôs ou, talvez, seus versos tenham mimetizado a sua vida. Graciette Salmon, escritora também paranaense, expressa delicadamente o talento e a índole de sua conterrânea:
"Tinha nome de monja: Maria Cândida de Jesus. Nome de predestinada para o Amor, não esse amor pequeno, instável, egoísta, limitado a uma só criatura, mas aquele que se espraia em carinho também pelos seres e pelas coisas, traduzido em bondade e compreensão, em doçura e serenidade. Era simples e humilde como um fio d’água, sem o saber, alegra e enfeita o caminho. Sem ambições, nem invejas, em seus longos anos de vida foi sempre essa água fresca e pura, cristalina e cantante.
E ainda agora, quando já partiu para a caminhada, com pés de silêncio, pelos jardins da paz, sua doce voz de fonte continua a ser ouvida, porque deixou o coração esparso por aí, dissolvido em versos, desfeito em Poesia."
É à alma que o alimento em poesia vem, é dos recantos escondidos, onde saudade e paz coexistem, que o encontro com a poesia de Maria Cândida Camargo (re)significa, e, desta maneira, compõe o puzzle de sua identidade. O que resta a nós, leitores, é perceber os grandes méritos dessa mulher simples que, com sutileza, registrou sua fala em linhas coloridas de verduras intensas, brancuras frias, transparências brilhantes.
1977 - 1° Ocupante

Mary Camargo é o nome literário de Marieta Camargo Turech. A poetisa e trovadora nasceu em Jaguariaíva, Paraná, em 7 de junho de 1906. Filha de Miguel Turech e Francisca Castro Mendes Camargo Turech. Professora normalista lecionava no Grupo Escolar Izabel Branco, em sua cidade natal.. Seu pseudônimo literário é “Mary Camargo. Publicou diversos livros, incluindo TURMALINAS (sonetos) e BEIRAL DE ESTRELAS (trovas). Foi chamada de “a voz do interior do Paraná” por Graciette Salmon, em reconhecimento à sua capacidade de representar nas letras as belezas do interior do estado. Foi ocupante da cadeira n.º3 da Academia Feminina de Letras do Paraná.
O estilo de Mary Camargo prima pelo uso de formas fixas (sonetos, quadras, rimas), e de imagens naturais e sensações visuais. Seu tom lírico contemplativo aparece mais carregado de espiritualidade, dor, simbolismo religioso; além de peso emocional, em alguns poemas e trovas. Todavia, ela não se esquece da beleza e sutileza,na atmosfera. Desse modo a poeta consegue um equilíbrio entre o tema do efêmero / natural e o da memória / espiritual. .Mary Camargo não é tão rígida quanto os versos clássicos portugueses, mas busca certa cadência e musicalidade,sendo os sonetos o gênero que ela domina com rigor formal e sensibilidade contemporânea.
Seus versos incluem reflexão sobre morte ou presença da espiritualidade em meio à tragédia ou tristeza, podendo causar uma espécie de inquietação meditativa. A ilusão em conflito com o real, o sacrifício em oposição à salvação, também estão presentes em suas obras, repletas de oximoros e metáforas.
Por outro lado, muitos sonetos e quadras da autora apresentam elementos que evocam leveza, suavidade, difusão; além da expressão poética de sensações táteis e imagens delicadas. Em alguns poemas e trovas, porém ela não se esquece da beleza e sutileza, na atmosfera. Desse modo a poeta consegue um equilíbrio entre o tema do efêmero / natural e o da memória / espiritual, transitando entre ambos.
Mary Camargo revela um romantismo modernizado, equilibrando emoção e contenção formal. Sua linguagem lírica busca a harmonia sonora e o valor simbólico da palavra, evocando uma poesia clássica na forma e moderna na sensibilidade. Seu estilo e linguagem elegantes caracterizam-se por um tom intimista e confessional. Usa metáforas sentimentais, personificações, paradoxos e oxímoros, aliados a uma musicalidade interna, com vocabulário poético elevado, sem rebuscamentos.
Seus versos tematizam amor e transcendência, tempo e efemeridade,,natureza e espiritualidade,com uma dicção clara e refinada. O eu lírico é introspectivo, mas não ensimesmado: observa o mundo com atenção estética e espiritual. A autora tematiza a Mulher e sua interioridade. Muitas vozes líricas femininas dela emergem, marcadas por delicadeza e força,
Uma vez que seus sonetos conjugam uma herança parnasiana e neoclássica, pela forma disciplinada, com sensibilidade contemporânea, pode-se afirmar que a obra Mary Camargo representa uma continuidade moderna da tradição lírica clássica, revelando beleza serena e filosófica, em que o verbo poético é também uma forma de meditação, onde há uma constante fusão entre paisagem e emoção interior, evocando uma dimensão mística da existência. Estamos diante de uma voz feminina singular e inolvidável.
1984 - Presente 2° Ocupante

Integrante da Academia Feminina de Letras do Paraná, desde 1984, Denise Azevedo Duarte Guimarães é natural de Santa Rita do Sapucaí (Minas Gerais), nascida em 1943, sendo filha do DR. Saul de Barros Duarte( cirurgião dentista e poeta mineiro) e da Professora Marisa Azevedo Duarte ( fundadora e presidente do Clube Feminino da Amizade, em sua cidade natal) .
Radicada em Curitiba desde 1969.É Doutora em Estudos Literários pela Universidade Federal do Paraná e Mestre em Letras pela PUC Paraná. Tem Mestrado (inconcluso) em Semiótica, na PUC de São Paulo. Tem Especialização em Literatura Brasileira e Graduação em Letras Português/ Inglês, também pela Universidade Federal do Paraná, onde se aposentou como docente em 1994.
Foi Coordenadora do Curso de Letras da UniIversidade Tuiuti do Paraná. Criou e foi vice-coordenadora do Curso de Especialização em Cinema da UTP.
No Mestrado e Doutorado em Comunicação e Linguagens da mesma Universidade foi vice-coordenadora e também Coordenadora da Linha de Pesquisa Estudos de Cinema e Audiovisual; bem como atuou como Professora, Pesquisadora e Orientadora de mestrado e doutorado, até 2023. Participa dos Grupos de Pesquisa registrados no CNPq: “Comunicação, Imagem e Contemporaneidade” (Parceria com CIAC - Portugal) e “Representações simbólicas do espaço urbano em narrativas audiovisuais”.
É membro da Associação Brasileira de Editores Científicos. Tem vasta experiência em periódicos acadêmicos, tendo criado várias revistas tais como” Estudos Brasileiros”(Impressa), na UFPR e a revista online “E-_Letras “, na UTP . Foi Editora Científica da Revista ”Interin” (Qualis CAPES) por mais de uma década.
Tem mais de 200 artigos e capítulos publicados, além de vários livros teóricos, sendo os mais recentes: COMUNICAÇÃO TECNOESTÉTICA NAS MÍDIAS AUDIOVISUAIS. Porto Alegre: Ed. Sulina, 2007; HISTÓRIAS EM QUADRINHOS & CINEMA. Curitiba. Ed. UTP, 2012; e TIPO/ICONO/GRAFIA POÉTICA EM CARTAZES DE CINEMA, Curitiba: Appris, 2018.
e-mail: dadenisedg@gmail.com
whatsapp: (41) 999277465
Fonte:
Dados fornecidos pela acadêmica Denise Azevedo Duarte Guimarães para o acervo histórico da Academia Feminina de Letras do Paraná.
Informações do acervo da Academia Feminina de Letras do Paraná.

